terça-feira, 30 de janeiro de 2018

Entre o oficial e o paralelo...

“-Moça, uma moeda, por favor...”, ouvi o jovem violinista dizer à mulher que passava pela rua. Isso, numa esquina do bairro do Gonzaga, na cidade de Santos, onde morei no comecinho da década dos anos ’90. Naquela época vivia de rodar o chapéu, apresentando-me de noite, na frente dos bares perto da orla. É impressionante ver como a cidade cresceu em tão pouco tempo e perdeu parte do seu encanto. Senti-me pequenininho ante a opulência urbana, o trânsito de carros e pessoas. Tudo muito. Compra e venda. No movimento intenso da calçada vi vários moradores de rua em frente às lojas, artesãos oferecendo seus produtos e vendedores de qualquer coisa junto a alguns artistas de rua. Vi um garoto pintado de prateado com o cabelo estilo punk no intervalo da sua representação, degustando seu lanche sentado, bebendo refrigerante em lata, vi um trompetista do lado do seu instrumento que estava apoiado diretamente no chão, contando moedas de centavos de real. Uma criança me olhou de forma simpática ao ver o desenho do Mímico Andarilho estampado na minha camiseta. Acho que pensou que eu também ia me apresentar por ali. Que nada, fiquei apavorado. O curioso é que eu estava vindo da cidade de Piracicaba, de apresentar meu espetáculo que tem como personagem central um artista de rua que faz “Peripécias” para conseguir dinheiro para sua sobrevivência.

Odiei o menino do violino que me pediu ao passar uma moeda para pagar a sua faculdade, a mim, que sempre consegui pagar minhas contas com esforço, tendo que fazer rir muito as pessoas nas ruas, mas jamais pedindo esmola...

E foi minha capacidade de “brincante” de rua a que rendeu como fruto o projeto que o pessoal do SESC da unidade de Piracicaba chamou de “Maravilhoso mundo da mímica”, quando apresentei um improviso nas comemorações do aniversário daquela cidade. Na ocasião, o programador do SESC me pediu o contato de mímicos, já que tinha a intenção de realizar uma mostra dessa linguagem no verão, no formato dos festivais de mágica que tinham acontecido por lá nos dois anos anteriores. Depois de consultar um amigo envolvido no meio dos mímicos, acabei chamando seis grupos e elaborando uma grade que depois fora adaptada de acordo com a necessidade do SESC. Dos seis grupos que indiquei, foram contratados quatro, comigo cinco. São intervenções e espetáculos interativos no espaço da convivência, alem de apresentações de espetáculos no auditório da unidade, durante os meses de Janeiro e Fevereiro, aos Domingos e Quartas feiras, dentro do Projeto SESC-Verão.

Foto de Ricardo de Paula

Fico feliz de ter contribuindo para esse encontro de pessoas ligadas a arte da mímica.
Fazem parte da programação do "Maravilhoso mundo da mímica" o mímico Jiddu Saldanha, de Cabo Frio, RJ, além da Cia Solar da Mímica, de Alberto Gauss, a Cia Mimos, o Mímico Newton Yamassaki e eu do estado de São Paulo.

Links sobre a atividade:



https://issuu.com/sescpiracicaba/docs/janeiro2018

sexta-feira, 12 de janeiro de 2018

E o dinheiro rolou pelo chão...


Muitas vezes as crianças choram ao ver um rosto branco, especialmente as menores, de dois anos de idade, já que elas estão em fase de descoberta do mundo. Algumas ficam olhando, atraídas, estando longe do palhaço, mas, se chegar perto, lá vem o choro. Tem criancinhas que não tem medo de nada, ao contrário, montam na garupa da minha “burrinha” ou então ficam dançando ao ouvir o som de jazz saindo da caixinha de som pressa a minha cintura.
Gosto de respeitar a livre expressão das crianças e apreender com elas.
É uma luta fazer entender aos adultos pais sobre a importância de deixar fluir a reação espontânea dos pequenos e de como isso às vai tornar pessoas mais seguras e independentes. Crianças com pais mais desencanados, que deixam seus filhos expressar-se naturalmente, são mais felizes.
No outro dia aconteceu um fato interessante, na frente de um restaurante onde eu me apresentava, em Campos do Jordão. Numa mesa tinha uma menina dessas de dois anos de idade que ficou encantada na minha presença, levantou e começou me olhar desde o seu mundo. Eu tentei interagir com ela sem invadi-la, como sempre o faço Os pais da menina, sentados á mesa, tentavam traduzir para ela o que estava acontecendo entre nós. O pessoal das outras mesas ficou observando o momento de “encanto” da relação entre palhaço e criança. A brincadeira de ação e reação durou um bom tempo, com a interferência dos pais da criança, é claro. No final, para estragar de vez história, a mãe da menina colocou dois reais na mão da pequena e a obrigou a me entregar, como pagamento pelo meu serviço. A menina, sem entender a situação, jogou os dois reais no chão. A mãe pegou a nota do chão instigando a menina a me entregar. Está jogou o dinheiro no chão novamente e começou chorar. No ato, eu peguei os dois reais e repeti a ação da menina, pegando e jogando a nota para vários lugares do chão. A menina parou de chorar de repente. Senti que o público ficou meio chocado pelo fato de eu estar literalmente “Jogando dinheiro no chão”. No fim, fechei a apresentação, coloquei a nota no meu bolso e continuei minha caminhada pelas ruas. Dinheiro não é tudo na vida. Quem sabe essa criança continue ficando encantada diante da presença do palhaço... 

Foto de Ricardo de Paula