quinta-feira, 7 de junho de 2018

Ponto de Partida

Desde 1994, “brincando” informalmente nas ruas do centro turístico da cidade de Campos do Jordão, é tão bom saber que existem pessoas que gostam do meu trabalho e que, vendo as dificuldades que estou enfrentando pela falta de espaço adequado para me apresentar, ficam me dando força para continuar por lá.

- “Não desista, um dia depois do outro”, me disse um casal de meia idade que me conhece a um bom tempo. Um outro casal mais jovem me chama desde dentro de um restaurante para tirar uma foto comigo e, depois de me dar um dinheiro, disse que me assiste a uns quatorze anos. Um homem me confessa que está colaborando pela primeira vez e que depende da situação econômica melhorar para continuar a faze-lo. Enfim, uma das situações mais bonitas foi quando um senhor morador do ABC Paulista, de descanso na cidade junto a sua mulher, caminhou um quarteirão e meio atrás de mim para me mostrar uma mágica que ele sabia fazer e me entregar cinqüenta reais no final. Tem gente que senta no restaurante mais badalado de Campos esperando a minha chegada. Casos como esses são os que me animam a pedalar oito quilômetros desde minha casa, no extremo da Zona Norte, até a rodoviária de São José dos Campos, e de lá pegar o ônibus para Campos do Jordão aos finais de semana.

Com respeito ao fato de ficar na passagem, se não for de carros, de pessoas, confesso que gosto do desafio de me adaptar aos espaços dispostos na rua.“Matemático urbano”, substituo a falta de flexibilidade com o manejo do ritmo, num jogo de ação e reação onde procuro a cumplicidade do público através da linguagem lúdica do palhaço, utilizando as técnicas de mímica e de consciência corporal.

Minhas aliadas naturais são as crianças, especialmente as menores de cinco anos, que tem à brincadeira à flor da pele.

Às vezes me sinto um pouco o Charles Chaplin do filme “Luzes da Ribalta”, quando este sai tocando seu violino nas ruas, depois de tomar a decisão de se afastar dos teatros e do seu jovem amor do qual se julga não ser merecedor. Mas, em realidade, sempre foi assim, desde o começo, em meados da década dos anos oitenta, em Buenos Aires, Argentina. De lá para cá tudo o que consigo vem através da rua. De lá vou para os outros espaços, inclusive teatros.

E falando em voltar ao começo, retomei a parceria de trabalho com a minha ex-companheira e mãe do meu filho, Silvia Nery, com a qual já apresentamos juntos durante sete anos, desde 1996 até 2003. Dessa vez trata-se de uma adaptação feita por mim do conto intitulado “O Príncipe Feliz”, do escritor Inglês Oscar Wilde e que conta com a direção da minha amiga, palhaça e atriz do teatro convencional, Adriana Marques.
Nos ensaios, por mais que sigamos as marcações sugeridas, tudo flui naturalmente no momento em que começamos a brincar livremente como os artistas populares improvisadores da rua.

`"Éramos tão jovens"...
Foto do espetáculo "A Pastora Marcela" tirada pelo mestre Afonso Miguel no Morro do Querosene, SP, 1996.

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