domingo, 25 de novembro de 2018

"Andarilho de bandeira branca"

"Você resgata um tipo de trato brincalhão e carinhoso que as pessoas foram perdendo com o tempo. Hoje, elas ficam ou brigando umas com as outras por causa de política ou então, cada uma na sua, na frente da tela do smartfone”. Essas foram às palavras de um senhor de classe média, logo apos assistir minha performance espontânea, na frente do “Boteco” do Djalma, em Campos do Jordão, uma semana depois das últimas eleições presidenciais. Essa apresentação foi bem especial e contou com a trilha sonora dos meus amigos Elayne e Matheus que estavam executando o som ao vivo dentro do boteco e com os quais sempre acabo tocando pandeiro, acompanhando o seu repertório de forró.

Como bom “Mímico andarilho”, desde criança já gostava de sair andando sozinho pelas ruas, atravessando bairros, descobrindo lugares e pessoas diferentes.
Relato aqui a experiência que tive nos dias anteriores as eleições, em São José dos Campos, cidade onde eu moro.

No Sábado, na semana anterior das eleições, fui realizar uma apresentação do meu espetáculo “As Peripécias do Mímico Andarilho” pelo projeto "Circulacão", da Fundação Cultural Cassiano Ricardo, na praça Afonso Pena, no centro da cidade. Estava preparado, como de costume, para incorporar qualquer tipo de imprevisto à história, que fui adaptando ao longo dos anos. Dessa vez “o fato” foi à segunda manifestação das mulheres que reivindicavam o "ele não", na época. Entre uma galerinha de gente jovem estavam alguns amigos meus da minha faixa etária.

O responsável da minha atividade perante a Fundação pediu para me afastar do grupo e ficar interagindo livremente com as pessoas, como o faço quando vou espontaneamente para as ruas, num outro canto da praça, onde acontece uma feira de artesanato, já que não podia ser associada à manifestação à instituição. Os artesãos adoraram a Idéia. Eu pude observar o grupo de manifestantes ao longe, do lado de fora.

Vi cinco bandeiras vermelhas que vieram envolver o grupo. Ouvi deles um tipo de discurso antigo, panfletário. Senti a rejeição dos populares que passavam pelo local em apoio ao outro candidato. Para mim ficou bem claro, apesar de não concordar nenhum pouco com as opiniões e as propostas do novo presidente, que a solução não está no confronto e sim no dialogo.

No Sábado posterior, um dia antes das eleições, rolou uma manifestação da mesma natureza numa outra praça do centro chamada "Do Sapo", esta, organizada por jovens militantes de esquerda junto aos artistas locais e, da qual, fui convidado a atuar como representante dos artistas de rua da cidade.

Cheguei no local na hora marcada e vi alguns grupos partidários. A cor tinha mudado do vermelho para o roxo, mas, eu senti o mesmo tom "abanderado" da outra vez. Quando o discurso passa a ser dogmático até a cor verde e amarela perde o sentido.

Vendo tudo aquilo, dei meia volta em sinal de retirada, mas, acabei voltando para praça.

Estacionei minha bicicleta do lado da fonte onde quatro sapos ficam cuspindo água pela boca, me caracterizei ai mesmo na frente do público e hasteei minha bandeira Branca da paz e do dialogo, amarrando-a ao guidão da magrela.

Percebi que o grupo de manifestantes era bem heterogêneo, inclusive, havendo várias famílias no encontro. Interagi no meio da moçada como o faço de costume na rua. Com movimentos rápidos fiz de conta que ia mergulhar na fonte dos Sapos. Depois peguei a garrafinha da bicicleta e brinquei, jogando pingos de água nas pessoas em volta. Uma menininha de dois anos de idade aceitou minha água para beber e a gente descobriu que ela estava realmente com sede; a toda hora vinha pedir mais água. Peguei meu mini banquinho na bike e fui sentar do lado da galera que assistia ao show de rock que rolava num palco improvisado. Depois levantei e fui para o outro lado da fonte. Apareceu um menino de uns sete anos de idade que me fez correr várias vezes detrás dele pela praça toda até juntos cansarmos e perdermos o medo. Na seqüência apresentei um número de mímica interativo onde as pessoas pulavam uma corda imaginária ao som de rock. No fim toquei chorinhos na minha flauta transversal para os vários grupos espalhados no local.

Voltei para casa vestindo o personagem, pedalando minha bicicleta por ruas e avenidas, atravessando bairros. A trilha sonora do percurso, executada desde minha caixinha de som pressa à cintura, foi do maravilhoso jazz chapliniano do músico belga Django Reinhardt.

Empolgados, os transeuntes partidários do atual presidente eleito, gritavam palavras de ordem para mim, mas, sem a mínima agressão, já que tratava-se da figura de um palhaço de bandeira branca.

"Chegando em casa". Foto tirada de um celular por Karol Reis
Link do som do Jazzista Django Reinhardt https://www.youtube.com/watch?v=3WHQ0twHQgo




quinta-feira, 20 de setembro de 2018

"Nas Asas de Santos Dumont"

Apresentação de Personagem "Santos Dumont", na FLIM (Feira de Literatura e Música) 2018, realizada no Parque Vicentina Aranha, nos dias 15 e 16 de Setembro, para o Instituto EMBRAER..

Para a construção da personagem, feita ás pressas, em dois dias de labuta, li sobre a vida e a obra de Santos Dumont, tentando deduzir rasgos da sua personalidade que eu pudesse interpretar. Para a caracterização contei com a colaboração de várias pessoas. Um amigo que já tinha representado o pai da aviação há vários anos atrás, me emprestou um terno que ficou do meu tamanho. Depois, um outro amigo, construiu o chapéu com feltro, usando como base um outro chapéu bem velhinho da minha coleção. Uma amiga me deu uma rosa branca de cetim que eu pus na lapela do terno e uma outra me emprestou uma réplica de um antigo relógio de bolso, além de uma pequena caixinha de música de manivela que interpreta “La vie en Rose” de Edith Piaf. Finalmente consegui tirar a tempo do conserto a minha caixinha amplificada de som que fica pressa à cintura. Através dela consegui tocar a trilha da personagem, composta de chorinhos de Pixinguinha, intercalados com efeitos sonoros de avião passando.

Apesar do meu receio no começo, a experiência foi realmente incrível, dada a importância de Santos Dumont para os moradores da cidade. Fui assumindo este na medida que interagia junto ao público que circulava pelo parque. Crianças conversavam comigo como se eu fosse realmente “o próprio”. Tive que me esforçar ao máximo para manter-me sério, já que pelo geral costumo rir nas minhas apresentações.


Foi um trabalho de teatro e interação que deu certo. Tudo foi se encaixando. Apesar de que tanto meu porte físico, como o formato do meu rosto ou a cor dos meus olhos serem diferentes a Santos Dumont, consegui pegar o personagem de dentro para fora, na introspeção, na contemplação, na gestualidade delicada. Trazendo elementos de um tempo antigo. A trilha sonora composta de chorinhos ajudou bastante a dar o clima da época. Até a maquiagem branca deu um tom de etéreo para ele. Alguém falou "Parece um fantasma" e eu com gestos respondi: "mais é!" Uma mulher falou comigo como se eu fosse o próprio Santos Dumont, perguntando como é que tinha chegado lá e eu respondi que estava testando a máquina do tempo de um colega inventor. Um senhor brincou dizendo que quem tinha inventado o avião eram os irmãos Wright. Veio a tona vários rasgos da vida de Santos Dumont dos quais eu tinha lido. Sua origem, sua família, sua sexualidade, sua tendencia suicida, etc. Enfim, inúmeros elementos que as pessoas iam trazendo para a personagem. Não saí imitando tudo mundo como estou acostumado quando vou brincar espontaneamente nas ruas. Fiquei mais na minha e as pessoas me chamavam e tiravam fotos comigo. Foi uma delicadeza e tanto. O público que frequenta o Parque Vicentina Aranha, em São José dos Campos é bem parecido ao público chique paulista que sempre valorizou meu trabalho na cidade turística de Campos do Jordão. Também teve o contato com o pessoal simples que trabalha no parque que brincava comigo me chamando de "Felipão" ou "Santos Dumont do Paraguai" pelo meu sotaque espanhol. 

Sou imensamente grato pelo meu oficio de ator, mímico e palhaço, por acreditar estar contribuindo para fazer esse mundo mais humano e solidário.

Foto tirada no Parque "Santos Dumont" com réplica do 14 Bis ao fundo

Mais fotos de apresentação na FLIM 2018


Link de vídeo "Santos Dumont brincando de aviador..."

Os bons ventos do segundo semestre...

Depois de um difícil primeiro semestre em que fiquei interagindo, batalhando o sustento na base de rodar o chapéu, nas ruas de Campos do Jordão, acabei sendo premiado com vários trabalhos institucionais a partir da segunda quinzena do mês de Agosto.

Os primeiros três, que fazem parte do Edital “Circulação” da Fundação Cultural Cassiano Ricardo, de São José dos Campos, foram a participação na IV Mostra de Circo, onde realizei o “Cortejo de um só”, desfilando com minha “burrinha”, na Feira do Colonial, brincando durante duas horas seguidas para um público simples e interativo, formando em grande parte de nordestinos moradores do bairro. O segundo e o terceiro foram às intervenções nas ruas do centro, pelo Festivale, Festival Nacional de Teatro, do qual participo de alguma forma desde 2005.


Depois realizei um serviço na SIPAT de uma fábrica, contratado pelo SESI da cidade de Jacareí, onde minha função, como mímico, foi a de “ilustrar” a fala de uma ergonomista que dava dicas sobre postura corporal para os funcionários da empresa.

O último trabalho foi o mais especial de todos e aconteceu nesse último final de semana, quando tive a oportunidade de representar o ilustre Santos Dumont para o Instituto Embraer, que cuida, entre outras coisas, do colégio onde estuda meu filho. Isso na FLIM, realizada dentro do belíssimo parque Vicentina Aranha, na cidade onde eu moro, São José dos Campos, SP. Falarei com mais detalhes sobre essa experiência numa próxima matéria.


Apresentação no calçadão de São José dos Campos pelo Festivale 2018 - Foto de Paulo Amaral



Link da Programação da FCCR de Agosto que inclui a IV Mostra de Circo

Link da Programação do Festivale:2018

Link de Álbum fotos do "Mímico Andarilho" no Festivale 2018




quarta-feira, 1 de agosto de 2018

De vocação “Andorinha”...

Do alto do morro, na região pobre onde me hospedo, na casa de um amigo, na cidade turística de Campos do Jordão, vejo as cúpulas europeias e me sinto o próprio personagem “Andorinha” do espetáculo que estamos montando com  a nossa companhia de teatro popular.

Durante a temporada de julho, quando vou me apresentar espontaneamente nas ruas do centro turístico, no bairro Capivari, como o faço em outros períodos do ano, enfrento uma multidão de público heterogêneo, sob o sol forte da serra, poluição sonora e falta de espaço apropriado para desenvolver minha “brincadeira” de interação.

Mas, cadê meus burguesinhos com os quais converso há anos?
Deles vejo só um aqui e outro acolá na “muvuca”. Uma família inteira, velha conhecida, assiste-me de uma mesa, enquanto “brinco” na frente do restaurante “Baden Baden”, no meio à turba. Eles acabam sendo a minha plateia exclusiva. Tendo como foco a luz do sol, Dionísio se estende entre nós brindando-nos com sua graça. Depois encontro a família numa esquina, quando estão indo embora e o “patriarca” desta, chegando perto de mim, disse-me: “Obrigado por tantos anos nos quais você nos traz a sua alegria”. Na mesma esquina um outro senhor, velho conhecido, vestindo umas pomposas meias de equitação até o joelho, cumprimenta-me horizontalmente enquanto mexe seus bigodes antes de me puxar para si e me dar umas palmadas carinhosas nas costas.

Para o meu show acontecer, sempre tem que ter alguém fazendo o papel de intercomunicador, seja criança ou adulto. Lembro de uma das apresentações, no último sábado, em que me deparei com um menino “protegido”, de uns quatro anos de idade, que estava sentado à mesa de um restaurante, na calçada, junto aos seus pais. Ele começou chorar ao me ver. A minha tarefa foi tirar o medo dele; então, fiquei o tempo inteiro interagindo com as pessoas que passavam pelo local, enquanto chegava perto e me distanciava do menino, refletindo sua sensação de vontade e repulsa ao mesmo tempo. No fim, depois de ter me aceitado, ele caiu na gargalhada e eu dei em troca toda minha atenção e carinho junto a uma espada de bexiga de presente.

É um fato ver como as pessoas andam desequilibradas diante das dificuldades do dia a dia. O palhaço no meio da rua é um antídoto para a saúde mental da população. Tento me doar da melhor forma que posso, assim como o fez “O Príncipe Feliz” da nossa história.
Link com tradução do conto do escritor irlandês Oscar Wilde:
http://volobuef.tripod.com/op_wilde_principe_feliz_oscar_mendes.pdf


Foto de "Dois Brincantes e o Príncipe Feliz"

Link da Companhia "Milongas Sentimentais" de Teatro Popular no Facebook:
https://www.facebook.com/Milongas-Sentimentais-Teatro-Popular-173882529422531/


quarta-feira, 25 de julho de 2018

"Espaço democrático"

Apesar do meu trabalho ter sido fortemente prejudicado pela falta de infraestrutura, já que dependo da interação com o público e isso fica complicado no meio da multidão, reconheço que nessa temporada de julho as ruas do centro turístico de Campos do Jordão têm se transformado num espaço democrático em que vários trabalhadores aproveitam a circulação de uma grande massa de público heterogêneo para batalhar o seu sustento.
Existem desde os vendedores de qualquer coisa (algodão doce, bexigas, balões, ímã de geladeira, trufas, etc),  passando por retratistas e pintores de quadro, artesãos que trabalham com madeira ou metal, até os que realizam shows como eu.

Retratista junto com artesão
Um artista de rua, que conheço a mais de dez anos, forma uma pequena semi-roda realizando inúmeras apresentações de mágica durante o dia ocupando um cantinho da praça. Ele imita de cabo a rabo a rotina que copiou de um mágico experiente. O conheci quando fazia papel de mímico, formando uma dupla junto ao irmão, que se chamava “Os Irmãos Sombra” e que na época acabou tendo um certo sucesso, apresentando-se no Programa do Ratinho e fazendo, inclusive, turnê no Japão, contratado por uma empresa patrocinadora. Isso foi pouco depois do Faustão colocar nome de “Sombras” a dois mímicos de rua argentinos que se apresentavam no seu programa. Aliás, depois disso, para o meu desgosto, as pessoas começaram a me chamar de sombra também.
“Não acredito mais na arte. Das pessoas que param aqui para me assistir poucos colaboram na hora de recolher meus ganhos no chapéu. Muitos se fazem de bobos e saem de mansinho, voltando quando recomeço meu show”. Foi o que meu “conhecido” me disse, além de comentar que seus irmãos moram e se apresentam nas ruas da Europa onde o público valoriza a arte. “Estou aqui para pagar minhas contas e só”. “Hoje em dia o negócio e escrever um livro e sair por aí dando palestras de auto ajuda”.

Apesar de seu discurso, fico admirado pelo fato de ele ter conquistado o seu cantinho onde desenvolve seu trabalho independente da “muvuca”, atendendo pelo geral às pessoas simples que estão de excursão pela cidade.

O seu cantinho também ganhou o pessoal que fica o dia inteirinho sob o sol, representando estátuas vivas. Eles aproveitam o grande fluxo de gente e de grão em grão vão enchendo o seu "cofrinho" com moedas e notas miúdas.

Estátua viva no meio da rua
Tem também os músicos de rua. Entre eles o melhor é um Blues Man representado por um moço jovem, alto, de barba e com aspecto ranzinza. Ele veste uma roupa esquisita que o faz parecer com a Pantera Cor de Rosa. Na sua performance faz a percussão com o pé, batendo com pedal num bumbo de bateria, enquanto toca violão e por vezes canta ou toca gaita.

Som contagiante de jovem músico "Blues Man"
Vídeo que realizamos junto a dois amigos há 11 meses atrás e que reflete a realidade da temporada de Campos de Jordão 2018:
https://www.youtube.com/watch?v=A6hWh0RAf0w&t=4s

quinta-feira, 7 de junho de 2018

Ponto de Partida

Desde 1994, “brincando” informalmente nas ruas do centro turístico da cidade de Campos do Jordão, é tão bom saber que existem pessoas que gostam do meu trabalho e que, vendo as dificuldades que estou enfrentando pela falta de espaço adequado para me apresentar, ficam me dando força para continuar por lá.

- “Não desista, um dia depois do outro”, me disse um casal de meia idade que me conhece a um bom tempo. Um outro casal mais jovem me chama desde dentro de um restaurante para tirar uma foto comigo e, depois de me dar um dinheiro, disse que me assiste a uns quatorze anos. Um homem me confessa que está colaborando pela primeira vez e que depende da situação econômica melhorar para continuar a faze-lo. Enfim, uma das situações mais bonitas foi quando um senhor morador do ABC Paulista, de descanso na cidade junto a sua mulher, caminhou um quarteirão e meio atrás de mim para me mostrar uma mágica que ele sabia fazer e me entregar cinqüenta reais no final. Tem gente que senta no restaurante mais badalado de Campos esperando a minha chegada. Casos como esses são os que me animam a pedalar oito quilômetros desde minha casa, no extremo da Zona Norte, até a rodoviária de São José dos Campos, e de lá pegar o ônibus para Campos do Jordão aos finais de semana.

Com respeito ao fato de ficar na passagem, se não for de carros, de pessoas, confesso que gosto do desafio de me adaptar aos espaços dispostos na rua.“Matemático urbano”, substituo a falta de flexibilidade com o manejo do ritmo, num jogo de ação e reação onde procuro a cumplicidade do público através da linguagem lúdica do palhaço, utilizando as técnicas de mímica e de consciência corporal.

Minhas aliadas naturais são as crianças, especialmente as menores de cinco anos, que tem à brincadeira à flor da pele.

Às vezes me sinto um pouco o Charles Chaplin do filme “Luzes da Ribalta”, quando este sai tocando seu violino nas ruas, depois de tomar a decisão de se afastar dos teatros e do seu jovem amor do qual se julga não ser merecedor. Mas, em realidade, sempre foi assim, desde o começo, em meados da década dos anos oitenta, em Buenos Aires, Argentina. De lá para cá tudo o que consigo vem através da rua. De lá vou para os outros espaços, inclusive teatros.

E falando em voltar ao começo, retomei a parceria de trabalho com a minha ex-companheira e mãe do meu filho, Silvia Nery, com a qual já apresentamos juntos durante sete anos, desde 1996 até 2003. Dessa vez trata-se de uma adaptação feita por mim do conto intitulado “O Príncipe Feliz”, do escritor Inglês Oscar Wilde e que conta com a direção da minha amiga, palhaça e atriz do teatro convencional, Adriana Marques.
Nos ensaios, por mais que sigamos as marcações sugeridas, tudo flui naturalmente no momento em que começamos a brincar livremente como os artistas populares improvisadores da rua.

`"Éramos tão jovens"...
Foto do espetáculo "A Pastora Marcela" tirada pelo mestre Afonso Miguel no Morro do Querosene, SP, 1996.

https://www.facebook.com/Milongas-Sentimentais-Teatro-Popular-173882529422531/

sexta-feira, 2 de março de 2018

Na Corda bamba de sombrinha...

"Entre a tristeza e a alegria, entre o medo e a fé, perambula meu sorriso de palhaço. Vou para rua impulsionado por uma louca emoção infantil, sou ingênuo, acredito na bondade alheia. Recolho meu ganhos no meu chapéu ou na minha caneca, como faço agora com vocês". (*)


Especialista em improviso ou em lidar com o inesperado, na minha segunda apresentação dentro do "Maravilhoso Mundo da Mímica", no dia 18-02, na "comedoria" da unidade do SESC de Piracicaba, na qual eu devia só ficar interagindo, acabei desenvolvendo uma história para uma plateia recheada de crianças pequenas. Foram quarenta minutos de improviso e, no final, fiquei sentindo falta de um fechamento para minha proposta.

Sou consciente que na maioria das vezes que tento representar um espetáculo formal, de palco, acabo me dando mal, já que preciso da energia que vem do contato direto com as pessoas, como quando vou "brincar" espontaneamente nas ruas.

Na apresentação do meu espetáculo "As Peripécias do Mímico Andarilho", dentro do projeto "Domingo no Parque", da Fundação Cultural Cassiano Ricardo, em São José dos Campos, no dia 25-02, acabou acontecendo o inverso. Com medo de perder a plateia, abusei da brincadeira com o público no começo, transformando o diálogo espontâneo no próprio espetáculo, que bem poderia se chamar de "Interação Pura". A diferencia é que consegui fechar a história recitando a poesia acima, depois de ficar improvisando sem falar durante aproximadamente quarenta e cinco minutos.

Tanto os moradores de São José dos Campos quanto os de Piracicaba ainda preservam um jeito simples caipira de ser. Fico pensando no palhaço solto no meio da rua e na sua função social, vejo o rosto dos adultos e das crianças que vem me abraçar no final do espetáculo. Olho dentro da minha caneca e noto que tem um bom dinheiro ganho com a "gorjeta" espontânea do público. Vou embora com meu coração radiante de emoção e minhas pernas cansadas após a jornada de trabalho. Fico grato pelo meu ofício de "brincante popular"...

Foto de Paulo Amaral



Mais fotos da apresentação do parque no link:
https://www.facebook.com/media/set/?set=a.1819524828120637.1073742766.146170118789458&type=3

(*) Poesia de espetáculo "As Peripécias do Mímico Andarilho"

terça-feira, 30 de janeiro de 2018

Entre o oficial e o paralelo...

“-Moça, uma moeda, por favor...”, ouvi o jovem violinista dizer à mulher que passava pela rua. Isso, numa esquina do bairro do Gonzaga, na cidade de Santos, onde morei no comecinho da década dos anos ’90. Naquela época vivia de rodar o chapéu, apresentando-me de noite, na frente dos bares perto da orla. É impressionante ver como a cidade cresceu em tão pouco tempo e perdeu parte do seu encanto. Senti-me pequenininho ante a opulência urbana, o trânsito de carros e pessoas. Tudo muito. Compra e venda. No movimento intenso da calçada vi vários moradores de rua em frente às lojas, artesãos oferecendo seus produtos e vendedores de qualquer coisa junto a alguns artistas de rua. Vi um garoto pintado de prateado com o cabelo estilo punk no intervalo da sua representação, degustando seu lanche sentado, bebendo refrigerante em lata, vi um trompetista do lado do seu instrumento que estava apoiado diretamente no chão, contando moedas de centavos de real. Uma criança me olhou de forma simpática ao ver o desenho do Mímico Andarilho estampado na minha camiseta. Acho que pensou que eu também ia me apresentar por ali. Que nada, fiquei apavorado. O curioso é que eu estava vindo da cidade de Piracicaba, de apresentar meu espetáculo que tem como personagem central um artista de rua que faz “Peripécias” para conseguir dinheiro para sua sobrevivência.

Odiei o menino do violino que me pediu ao passar uma moeda para pagar a sua faculdade, a mim, que sempre consegui pagar minhas contas com esforço, tendo que fazer rir muito as pessoas nas ruas, mas jamais pedindo esmola...

E foi minha capacidade de “brincante” de rua a que rendeu como fruto o projeto que o pessoal do SESC da unidade de Piracicaba chamou de “Maravilhoso mundo da mímica”, quando apresentei um improviso nas comemorações do aniversário daquela cidade. Na ocasião, o programador do SESC me pediu o contato de mímicos, já que tinha a intenção de realizar uma mostra dessa linguagem no verão, no formato dos festivais de mágica que tinham acontecido por lá nos dois anos anteriores. Depois de consultar um amigo envolvido no meio dos mímicos, acabei chamando seis grupos e elaborando uma grade que depois fora adaptada de acordo com a necessidade do SESC. Dos seis grupos que indiquei, foram contratados quatro, comigo cinco. São intervenções e espetáculos interativos no espaço da convivência, alem de apresentações de espetáculos no auditório da unidade, durante os meses de Janeiro e Fevereiro, aos Domingos e Quartas feiras, dentro do Projeto SESC-Verão.

Foto de Ricardo de Paula

Fico feliz de ter contribuindo para esse encontro de pessoas ligadas a arte da mímica.
Fazem parte da programação do "Maravilhoso mundo da mímica" o mímico Jiddu Saldanha, de Cabo Frio, RJ, além da Cia Solar da Mímica, de Alberto Gauss, a Cia Mimos, o Mímico Newton Yamassaki e eu do estado de São Paulo.

Links sobre a atividade:



https://issuu.com/sescpiracicaba/docs/janeiro2018

sexta-feira, 12 de janeiro de 2018

E o dinheiro rolou pelo chão...


Muitas vezes as crianças choram ao ver um rosto branco, especialmente as menores, de dois anos de idade, já que elas estão em fase de descoberta do mundo. Algumas ficam olhando, atraídas, estando longe do palhaço, mas, se chegar perto, lá vem o choro. Tem criancinhas que não tem medo de nada, ao contrário, montam na garupa da minha “burrinha” ou então ficam dançando ao ouvir o som de jazz saindo da caixinha de som pressa a minha cintura.
Gosto de respeitar a livre expressão das crianças e apreender com elas.
É uma luta fazer entender aos adultos pais sobre a importância de deixar fluir a reação espontânea dos pequenos e de como isso às vai tornar pessoas mais seguras e independentes. Crianças com pais mais desencanados, que deixam seus filhos expressar-se naturalmente, são mais felizes.
No outro dia aconteceu um fato interessante, na frente de um restaurante onde eu me apresentava, em Campos do Jordão. Numa mesa tinha uma menina dessas de dois anos de idade que ficou encantada na minha presença, levantou e começou me olhar desde o seu mundo. Eu tentei interagir com ela sem invadi-la, como sempre o faço Os pais da menina, sentados á mesa, tentavam traduzir para ela o que estava acontecendo entre nós. O pessoal das outras mesas ficou observando o momento de “encanto” da relação entre palhaço e criança. A brincadeira de ação e reação durou um bom tempo, com a interferência dos pais da criança, é claro. No final, para estragar de vez história, a mãe da menina colocou dois reais na mão da pequena e a obrigou a me entregar, como pagamento pelo meu serviço. A menina, sem entender a situação, jogou os dois reais no chão. A mãe pegou a nota do chão instigando a menina a me entregar. Está jogou o dinheiro no chão novamente e começou chorar. No ato, eu peguei os dois reais e repeti a ação da menina, pegando e jogando a nota para vários lugares do chão. A menina parou de chorar de repente. Senti que o público ficou meio chocado pelo fato de eu estar literalmente “Jogando dinheiro no chão”. No fim, fechei a apresentação, coloquei a nota no meu bolso e continuei minha caminhada pelas ruas. Dinheiro não é tudo na vida. Quem sabe essa criança continue ficando encantada diante da presença do palhaço... 

Foto de Ricardo de Paula