quinta-feira, 3 de janeiro de 2019

Com o olhar da criança

Na ingênua e doce figura da menina tudo combina em tons de rosa, o laço de fitas no cabelo, seus sapatos, o ursinho de pelúcia que ela carrega no colo e até suas olheiras, sintoma, talvez, de alguma alergia oftalmológica. O nome dela e Jade, mas bem que poderia ser “Jade Rosada”. É ela quem nos recebe junto a sua tia, responsável pela nossa apresentação no Auditório Cláudio Santoro, em Campos do Jordão.

Contratados pela entidade que cuida o Museu Felícia Leirner, tudo se mostra imenso para nós, assim como a realidade aos olhos de uma criança. O enorme elevador de carga onde depositamos os objetos da peça, os altos muros de tijolo do auditório, o iluminado teto abobadado que deixa aparecer à exuberante mata em volta através das suas vidraças e até o enorme palco, por onde fiquei andando como beduíno no deserto, enquanto as pessoas visitantes do espaço entravam e sentavam na platéia, vendo a atividade preste a acontecer.

Apesar de que o combinado era apresentar o espetáculo num canto do palco, colocando as crianças sentadas no mesmo, formando um semicírculo em volta da gente, não teve jeito; tivemos que apresentar da forma tradicional, ou seja, nos no palco e o público, de todas as idades, nas poltronas do auditório. Colocamos os objetos na frente, no meio do palco e, como a história começa com a nossa chegada e a montagem do cenário na frente das pessoas, tudo se desenrolou naturalmente, como se fosse na rua. Vindos de uma semana de trabalho intenso, onde tivemos a oportunidade de mergulhar na trama, junto ao auxilio do diretor e dramaturgo Dagoberto Feliz, patrocinados pelo projeto “Cidade em Cena” do SESC de São José dos Campos, encaramos o desafio com o entusiasmo necessário.

Para mim foi um prazer incrível ter a oportunidade de me apresentar no palco daquele templo onde acontece o Festival de Música no inverno, depois de quase vinte e cinco anos nos quais venho realizando intervenções, de forma espontânea, nas ruas do centro turístico de Campos do Jordão.
Senti-me criança, como Jade, que ficou ali, sentada na frente da gente, cúmplice da nossa experiência.

Sem dúvida, o texto que escrevi para “Dois Brincantes e o Príncipe Feliz”, adaptação do conto original do escritor irlandês Oscar Wilde, reflete minha vivência em Campos e a visão que tenho sobre o contraste que existe entre as pessoas pobres moradoras da cidade e o turismo de alto nível que movimenta sua parte financeira.

O Príncipe Feliz da nossa história se desfaz das suas riquezas e as entrega aos pobres para amenizar o sofrimento destes, assim como nós as entregamos ao público presente.

Na mistura de tristeza e de alegria que a peça produz temos nos olhos arregalados das crianças a resposta positiva que esperávamos no final da apresentação, especialmente de Jade, a menina cor de rosa, que nos acompanha até o táxi que nos leva de volta até a rodoviária.

“Dois Brincantes e o Príncipe Feliz”
Apresentação realizada no dia 23 de Dezembro de 2018
Apoios de Marcelo “Brasões de Família” e de Cine Clube Araucária.
Realização. “Museu Felícia Leirner - Campos do Jordão”.


Foto: Ana Paula


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